Aproveitar a oportunidade

Tenho recebido muita correspondência, e alguma muito interessante. Gostei muito de ler a carta de Berta Neto, na qual descreve uma visita relativamente recente que fez ao Maputo. Transcrevo:

Foi a minha primeira vez em África. Nunca me senti muito atraída por este continente, mas lá tive de ir a um congresso de engenheiros, um daqueles encontros ditos "científicos" recheado de eventos sociais e com imenso tempo livre. A viagem foi longa com uma escala interminável em Joanesburgo e quando cheguei a Maputo estava em tal desalinho que não sabia em que terra estava. Só quando pisei o chão, é que pensei "estou em África" e agucei os sentidos para me forçar a perceber as diferenças. E eram muitas. O caos era total. Nada funcionava, era preciso ir improvisando. Ia distribuindo euros por pequenos favores. Dirigiam-me tratamentos estranhos "senhora" "mãezinha" que sabia serem interesseiros mas de que no fundo gostava. Ia observando as pessoas, a forma como se comportavam, mas à minha beira perdiam a naturalidade. Ficava triste com isso porque sentia uma rara afinidade com aquele lugar, mas tudo me recordava que não pertencia ali. Quando fui tomar banho na baía de Maputo, a minha branquidão sobressaiu no meio de toda aquela gente preta. As crianças riam-se e apontavam. Foi engraçado. Todos os dias, lia os jornais para perceber as coisas por lá, queria integrar-me. Fui reparando que as pessoas não se queixam muito, vivem a vida com o que têm. Agarram as oportunidades quando elas aparecem. Um dia, rebentou uma conduta de água no meio da rua e os transeuntes foram logo buscar roupa a casa que lavaram ali no passeio. Houve até quem tomasse banho. Os meus colegas lamentaram imediatamente a pobreza, mas eu achei que as pessoas souberam aproveitar a oportunidade. Se estivesse no lugar deles, acho que fazia o mesmo.


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