Eles riem-se

O teu pai deve estar a dar voltas na tumba, disse-me ontem o meu afilhado, o mais novo.
Não, não está. Não penses assim. Onde quer que ele ande agora, se é que anda, já se desprendeu da cultura na qual foi educado, e sei que concorda comigo. Porque agora poderá ver e sentir como se estivesse dentro de mim. E eu era uma criança. Não havia em mim preconceitos ou maldade. Eu era tábua rasa.
Riu-se. Gosta de me provocar. Depois diz, eu sei, e ri-se outra vez.

Anteontem, um primo que também esteve em Lourenço Marques, e que quando veio foi do MRPP, e do Guru Maharaji, e que fumava umas brocas jeitosas, disse-me, então, pá, estou a ver que escreveste isto à luz de uma interpretação actual do que aquilo foi.
Tu também estiveste lá, tu sabes o que aquilo foi. Não é um interpretação actual, nada. São as memórias de uma criança. Já leste?
Não, ainda não. Vou ler.
Olha que eu dou muita porrada nos brancos. E nos negros também, a certa altura. Comem todos.
Ah, porrada nos negros está certo. Pelo menos sabes que os pretos nasceram para levar porrada. E riu-se.

A minha família, ultimamente, acaba sempre as conversas comigo a rir.

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