Árvore de carne

Na segunda-feira, se calhar na terça, a Morena meteu-se dentro dos cobertores e encostou-se muito a mim, como se se empurrasse para dentro do meu corpo para sorver o meu calor. Aconcheguei-me a ela, sonolenta, confortada. Na sonolência, vi na minha mente a imagem do que deveríamos ser. Não foi um sonho. Estava consciente, entorpecida. Era o meu corpo macio e doce, tal como é agora, e da minha barriga saía o tronco da Morena, como um ramo da minha árvore. E do meu peito saía a Micas, que era o outro ramo. As três formávamos uma árvore de carne. Ia dizer que parecíamos um ciborgue, mas seria errado. Tudo em nós era produto da natureza. Não tínhamos circuitos integrados, nada de pele artificial, nem chips no córtex cerebral. Tinha sido um momento de inaudita perfeição da natureza. O meu sangue e o seu sangue corria indiferentemente as veias dos três corpos. Os nossos corações batiam em sincronia, e já nada nos distinguia. Éramos perfeitas; podíamos morrer. Mas exactamente por sermos tão perfeitas, queríamos viver.

Mensagens populares