Memória e silêncio

No silêncio existe solenidade e emudecimento. O silêncio concentra-nos no objecto, e promove a reflexão. Deve ser por esse motivo que, em memória das vítimas, costumam guardar-se minutos de silêncio. Creio que as vítimas prefeririam que se falasse.
A História enfrenta este grande óbice que cabe aos investigadores ultrapassar: o silêncio sobre aquilo que todos sabem e todos calam. O que não convém, não parece bem, não honra, não cabe nos currículos nem nas cartas de apresentação. Se há lixo, varre-se para debaixo do tapete e deixou de existir, nunca o vimos, nunca ouvimos falar, não demos por nada.
A História precisa das ovelhas negras sem pudor, bocas que falam demais, que dizem e registam o que deveriam calar para que fosse possível delinear um cadastro limpinho. Elas vão deixando pistas que podem analisar-se, interpretar-se.
Muitas vezes me interrogo sobre como tem sido possível fazer-se História, uma História sem fantasia, sem rodriguinhos, nos meandros do enorme silêncio que pesa sobre os acontecimentos que marcam o percurso de um povo, de um país.

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