A Igreja não tem culpa

Escandaliza-vos que haja abusos sexuais na Igreja Católica? A mim, não. Não me admira que os párocos abusem da confiança dos seus paroquianos, de qualquer idade, para com eles alcançar fragmentos materiais do céu físico, que lhes está vedado por motivos de grande coerência mística, nuns aspectos, e criminal, noutros.
Não me escandaliza, primeiro, porque os párocos são seres humanos, e, segundo, porque entre os párocos existem pessoas tão disfuncionais como qualquer leigo.
Não me passaria pela cabeça a ideia de que um padre não sentisse atracção sexual por uma mulher, um homem ou uma criança. Acontece aos seres humanos. Os que têm responsabilidades dentro da Igreja não são pessoas diferentes. Alguém quis que fossem mais sagrados. Eles quiseram, talvez. Alguns conseguiram. Devem sentir-se como eu relativamente ao apelo sedutor do croissante misto, "não devia, não devia, não devia, mas, ai, apetece-me tanto, é só uma trinquinha, e, pronto, agora sinto-me muito culpada, mas já está, que fazer?"
Os problemas da Igreja não pertencem à Igreja, mas à sociedade, na medida em que a Igreja a acolhe. Se a pedofilia foi e é uma prática corrente, e todos, de alguma forma, passaram por ela, como objecto ou testemunha, como poderia a Igreja estar imune? Nessa presunção da diferença, a própria Igreja falha. Acredita que, ao escolher um caminho espiritual, teriam de revelar uma moral incorruptível. Trata-se de uma questão insolúvel no seio da Igreja; mesmo que venham a conceder, aos religiosos, o direito a quebrar o voto de celibato, mesmo que se abram as suas portas às mulheres. A abertura da Igreja não servirá como garantia de pureza, porque entre homens e mulheres livres no exercício do sacerdócio, celibatário ou não, existirão sempre os que aceitam as regras, e as cumprem, e os restantes. Nas igrejas protestantes, onde o voto de celibato não existe, a pedofilia, bem como o assédio sexual e moral não desapareceram. Porquê? Porque no meu bairro, de onde pode sair matéria-prima sacerdotal, também cá temos de tudo.
Este não é um tempo mais pedófilo nem mais orgíaco, porque todos os tempos o foram, havia era menos comunicação social, ou seja, menos polícia de costumes. Havia segredo.

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