Prova de Desenho: impressões sonoras


Os carros sobem a rua e param no semáforo. Ouço-os meter a primeira e arrancar. Na silêncio da sala, o ruído dos lápis riscando o papel com calma, ou um raspar rápido, sempre no mesmo sentido, preenchendo a forma, zezezezeze. O papel manteiga crepita nas mãos. Abre-se uma caixa de lápis de cor. Um ruído metálico. Os lápis chocalham dentro. Uma gota de tinta-da-china desliza no godé. O pincel largo da aguada produz um chchchch quase inaudível ao lavar o papel com o seu rasto escuro. Numa mesa, as costas da mão varrem raspas de borracha. Lá fora, os pardais da tarde piam nos arbustos. O paus de pastel emitem na minha direcção um silêncio oleoso que o dedos dela atenuam ao puxar a cor, mesclando-a. Passa uma ambulância com a sirene apitando. Uns godés cascalham no saco de plástico. Um frasco de vidro pousa na mesa. As lâminas verticais dos estores batem enormemente com a brisa lá de fora. As janelas fecham-se com um estampido. Uma outra folha para novo exercício: o papel da prova ondula metalicamente ao sacudir-se no ar. O lápis pousa na mesa. A fricção das faces de uma caixa de papel ao abrir-se. Uma cadeira arrasta. Há no chão uma garrafa de plástico que tomba surdamente como um bêbedo gordo que regressa a casa. As pulseiras da menina da frente tamborilam o tampo da mesa. O carro da polícia buzina autoritariamente lá em cima. A água a correr na torneira aberta. Os pincéis tinem contra os frascos meios de água. Uma borracha roça vigorosamente o papel da prova. Alguém sopra da mesa as raspas de borracha. As diferentes notas de piano dos lápis de cor rolando na caixa sob dedos de quem escolhe o tom certo. Um suspiro. Passos na rua. Lá fora descem a rua a correr para apanhar o autocarro. Estar lá fora...

Mensagens populares