O beijo de Diana



Diana de Gales casou a um sábado, se bem me lembro. Eu morava com a tia Ju, em Cacilhas, e nesse dia ninguém nos despegou da televisão a preto-e-branco.
A tia Ju era costureira e estava interessada nos modelos dos vestidos. Eu, no conto de fadas.

A doce Diana, educadora de infância, casando com o príncipe após ter provado a sua virgindade e adequação ao protocolo! E que linda!
Eu não pretendia casar com um príncipe. Chegava-me um modesto professor ou mesmo um bancário que gostasse mesmo de mim, mesmo, mesmo. Uma coisa a sério. Que vivêssemos um para outro. Que tivéssemos filhos, no máximo dois, e um apartamento no qual nos pudéssemos amar e ser felizes, tudo o mais normal possível, como qualquer dos meus vizinhos. Como todas as outras raparigas de 18 anos era só isto que eu queria.

Preocupava-me apenas o vestido do meu casamento. Não poderia ser farfalhudo como o da Diana - engordar-me-ia muito. E o branco também não deveria favorecer-me. Segundo a tia Ju, para mim, tudo em evasé, para disfarçar barriga, anca, e decote em v, para favorecer o peito cheio. E em pérola. A questão do vestido ocupou o meu pensamento durante algum tempo.

Hoje, aconteceu-me entrar numa instituição pública no momento em que, na televisão ligada, os noivos reais britânicos se beijavam à varanda do palácio, de acordo com os procedimentos habituais, e lembrei Diana. Era o seu filho, mas não o mesmo beijo. Não estava ali o enlevo de Diana com Carlos nem o beijo imaginário que, nessa data recuada, me imaginei a dar, em sonhos, ao meu amor inexistente. Hoje eram outros noivos.
Os tempos mudaram muito, e ainda bem, mas desejei rever o beijo de Diana, tão doce e crédula como eu fui, porque eu fui, em tempos, esse beijo, perdido, traído, embora.

Na mesma varanda, o princípe que o recebera mostrava-se ao lado da segunda mulher, provavelmente a única que amou. Senti-me chorar a morte de todos os beijos que começaram e terminaram como o de Diana. A morte da ilusão do amor para sempre, a morte dos 18 anos, a inevitável morte dos sentimentos, das pessoas, dos beijos. Na vertigem de tristeza que me assolou, chorei também a morte do que fui.



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