Uma miúda sentada no degrau da cozinha

Olho para a minha carita de miúda, nas fotos, e penso, não sabias nada. Sonhavas, e tudo se perdeu.
Sorrio nessas fotos da infância, muito impregnada de vida, de modelos, de histórias. Observo-me com ternura, e lamento ter-me enganado e ter sido enganada. Afinal não era como imaginei.
O que sonhei?! Já não me recordo, mas sei que não o tive. Tive-me, e já não foi mau. Decidi as minhas decisões, escolhi o que pude.
Mas quando olho para o meu rosto de menina tenho pena da inocente criança. Eu já sei o seu futuro e ela ainda não, coitadinha. Não imagina que vai comer o pão do diabo. Tão ignorante! E imagino que volto lá atrás, ela está sentada no degrau da cozinha, descalça, com as mãos segurando o queixo, e lhe segredo ao ouvido, querida, não tenhas medo, não deixes que te domestiquem. Ouve, tudo será diferente. E estou junto dela, ajoelhada, amando-a, quando percebo que afinal não se deixou domesticar. Digo-lhe, segue então o teu caminho. Tens tempo para aprender. E enquanto lho digo, sei que vai surpreender-se, lutar, reclamar, e no fim, aceita, porque aceitar é a única saída. Deixo-a sentada no degrau. É bonita. Tem sonhos. Não a posso ajudar.

Mensagens populares