Correm o risco de se ter manifestado para nada



Tenho más notícias para a rentrée. A gritaria das manifestações de 15 e 21 de Setembro ainda não chegou, portanto não vai dar para ficar no sossego do sofá a ver a Casa dos Segredos. Por outro lado, considerando o preço da eletricidade, sair de casa e não ter de ligar os caloríferos, pode ter as suas vantagens para o esfarrapado orçamento das famílias.

Vejamos, parece que o ciclo do 25 de Abril acabou. Começou muito torto e amaldiçoado, foi o que foi. Não resultou. Uns não sabiam, outros aproveitaram-se. Costuma haver algum equilíbrio entre honestidade e pulhice, mas, neste caso, a balança encalhou. Portanto, se é para experimentar outra ideia qualquer, convém começarmos a mexer-nos, coisa que não tem sido muito usual num país onde se deixa que "eles" façam o que lhes apetece, porque "eles" é que sabem, embora toda a gente admita que só lá estão a encher a pança. O problema é que agora não se limitaram a enchê-la, e resolveram mandar os portugueses cortar o estômago sem anestesia. Dói, claro que dói.

Não tenham ilusões. Eles não sabem o que estão a fazer. Recuar na TSU para tirar noutro sítio qualquer é o mesmo que pedir à costureira para cortar a saia na baínha e não na cintura: a peça fica mais curta de qualquer das formas. O que o governo ainda não percebeu, perdoem-me o lugar comum do não perceber, é o que o problema transcende a TSU, e as manifestações de 15 e 21 de Setembro foram quanto a isso bem claras. Não queremos o sistema que temos, portanto a coligação não tem condições para governar, sejam quais foram os dados a lançar após o Conselho de Estado, ou após eventuais remodelações. Perdemos a inocência. Está perdida. Não acreditamos em quem nos governa, nem na Europa nem na América nem nas bolsas nem nos bancos; percebemos que ninguém está por nós em lugar algum, nem hoje nem no passado, que temos sido peças num jogo útil a quem não está interessado em ouvir-nos. Mais, queremos saber onde está o dinheiro dos nossos descontos ao longo de uma vida de trabalho, queremos saber porque nos roubaram o valor das reformas, porque nos cortaram os subsídios e os direitos laborais. Queremos saber como foi possível 5 euros não valerem hoje o caganito de um conto de réis. Desenterrem o nosso dinheiro lá do sítio onde o enterraram. E queremos julgamentos sérios para quem delapidou o Estado, para quem manobrou, jogou sujo.

Perdemos o respeito a esta gente que vai sendo eleita e nos lidera nas estruturas políticas, manipulando, jogando ao monopólio com os recursos do Estado, comprando habilitações, facilitando para os amigos, trocando influências. Tratá-los por Vossa Excelência?! Donde veio esta gente?! Quem são? Como aprenderam a gerir um país? São melhores que o Toino Maluco ou apenas disfarçam com mais eficácia? É por isso que nos cartazes das manifestações os mandámos foder-se prolificamente. São gajos, e é assim que os tratamos.

Basta passar os olhos pelas fotos das manifestações e ler os cartazes para perceber que não os queremos, que estamos para além da TSU, que queremos um novo modelo, uma outra forma de vida. Eu fi-lo: "Gatunos"; "Cavaco, dá-me a tua reforma!"; "Gostava de trabalhar antes dos 36, ter uma casa, filhos e educá-los com dignidade"; "Roubam aos pobres para dar aos ricos"; "Tenho fome no estômago e sede de justiça na alma"; "Capitalismo fora das nossas vidas"; " Não somos só números"; "O poder é nosso"; "Acordámos"; Queremos as nossas vidas"; "Quero o meu futuro de volta"; "Lutamos pela vida"; "Políticos tenham vergonha"; "Reduzam os salários dos políticos e gestores"; "A minha geração precisa de um país"; "Políticos ladrões devolvam-nos a esperança"; "Que futuro terão os nossos filhos?"; "Basta de roubar o povo"; "Estou triste"; "Vocês metem-me nojo"; "Quero ser feliz, porra"; "Dívida, quem a contraiu que a pague", "O lugar do ladrão é na prisão"; "Este país sufoca-me. Deixa-me viver"...

Não, não há condições para continuar. Não, a TSU não chega. A gente agora quer experimentar ter outra vez uma vida, se não se importam, porque não nos estamos a sentir nada representados e estamos um bocado chateados. O governo tem de perceber que, como se lia no cartaz, mete mesmo nojo.

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