O cante albanês

Camponesa albanesa


Há algum português que não conheça a lamentação pela vida madrasta, pelo trabalho excessivo e mal pago? Esse é o motivo pelo qual todos compreendemos o cante alentejano e sentimos que tem muita alma. A nossa. Quantos, entre nós, se podem dar ao luxo de não reconhecer ali a história da família ou o seu próprio drama de vida?
Ouvir 60 minutos de cante sem entrar em transe ou desejar atirar-se da ponte é que pode ser mais difícil. Eu gostava de deixar à Humanidade um património mais alto astral, como dizem os brasileiros. Uma bossa nova ia bem. A passada ritmada, baloiçada da garota do Ipanema, sorrindo de bem com a vida. Porque imaginemos que, por dez segundos, deixamos de ser portugueses e conseguimos olhar-nos pelo lado de fora do molde de tristeza conformada no qual nos abrigamos, o que vemos? A Albânia. Uns camponeses quaisquer na Albânia profunda, num lugar tão recôndito, tão miserável, tão deprimente que o único entusiasmo que conseguiremos gerar, será o de umas senhoras inglesas reformadas, de classe alta, que já se devem estar a organizar para vir fazer some charity work. 
Isto é na melhor das hipóteses, porque a menos que as autoridades me empurrassem à força para dentro de um meio de transporte previamente direcionado, eu, que até sou boa pessoa, não teria ânimo para me deslocar à Albânia, nem por motivos humanitários. 
Não me dou bem com o martírio, não sinto vocação, não lhe vejo futuro.



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