Sibila 1

Ilustração: John Collier



José Sócrates, o português comum


Está tão inocente nas questões do enriquecimento ilícito como no caso da sua licenciatura.
Usou influência e poder, manipulou e jogou com pleno conhecimento das formas legais de fintar a Lei. Não é mais culpado do que qualquer outro português, independentemente da classe social e cultural a que pertença. Foi esperto e desenrascado. Agiu de acordo com a informalidade da nossa cultura, um agradável laissez faire, laissez passer, nada calvinista, portanto facilitador, útil e, em alguns casos, até desejável - desde que não prejudique outrem. A chave reside na incontornável questão moral: o que nos serve é sempre correto, desde que não leve prejuízo a terceiros.
As manobras que José Sócrates desenvolveu para gerar enriquecimento não as aprendeu sozinho. Outros, antes de si, fizeram o mesmo, à vez e simultaneamente. Não deve haver muita gente no Governo nem na Oposição ou em cargos de poder nas altas finanças, antes ou depois, cujo percurso possa ser investigado sem se encontrarem caminhos sinuosos, becos, pura magia em crédito bancário. É toda uma geração e filiação de roubalheira pública com origens eventuais nos primórdios da Primeira República. Ou antes, porque tudo se compra e tudo está à venda onde existe pobreza, de que esta terra é mãe e filha.
Puxem-se um pouco mais as redes e virá o grosso do peixe, já sem surpresas. Todos nós sabemos quem e onde. 
Um dia descobrir-se-á de onde vieram os milhões de José Sócrates, como os de outros. E os favores pagos a pequenos e grandes. Toda a teia, que envolverá direta ou indiretamente, gente tão de fora como eu. De nada nos servirá, a não ser para memória futura, porque aqueles que tiveram de morrer para que alguns vivessem e vivam como faraós lusitanos, estão já mortos. Nós, por exemplo.

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