Uma casa vazia


Foto: @Saul Leiter



À minha espera há uma casa sozinha e uma cadela feliz.
Porque é ela feliz? Com que sonha? O que espera amanhã? A solidão da casa não a atormenta. A sua casa sou eu, mas ela não é a minha casa. Totalmente. Eu devo ser a minha única casa quando adormeço, porque a solidão da casa que me espera me atormenta.
Junto à casa onde vivo, construíram, há anos, um centro de apoio a velhos. Aí vão almoçar e passam parte das horas que se lhe antecedem e seguem. Estão sentados à porta ou na escadaria. Têm um ar vazio. Fazem palavras cruzadas ou olham a rua, apenas. Esperam. Não falam muito. Alguns chamam a cadela. Fazem-lhe festas. Brincam com ela. Dão-me migalhas de pão que têm nos bolsos. Trocamos algumas palavras de circunstância. Olho-os. Olham-me. Contemplo o seu olhar  triste e cansado. Dá vontade de os abraçar. Seria como se me abraçasse.
Se fico uns tempos sem passar à porta do centro, mudam os velhos. Já são outras caras. Não pergunto pelos anteriores. Tenho vergonha e medo do que me dirão. Mas não esqueço os seus rostos e gestos. Tenho-os guardadas no coração da memória. A forma como sorriam, olhavam, faziam palavras cruzadas. Nem os seus nome sei. José? João? Pessoas com casas vazias à sua espera. Talvez pessoas com com cães felizes aguardando ansiosos a sua chegada.

Houve dias em que a vida foi uma festa. 

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