O cachecol de Yanis Varoufakis

Fantasiar uma vida com Yanis Varoufakis adoça os dias de Leonor Amaro. Sonhar com esse homem  inteiro e afiado, sólido e carnal entrando-lhe casa adentro cansado do trabalho político ou académico, suspirando ao chegar junto a si, enlaçando-a, finalmente, beijando-a e murmurando, "faço hoje o jantar para ver se descontraio um bocado; vem só para ao pé de mim ler-me o que escreveste hoje" da-lhe ânimo.
"Ele é tão inteligente, não achas, mãe?!", comenta Leonor.
"É um homem perfeito, lá isso...!", observa Maria da Esperança. 
"E decidido. Sabe impor-se. Não fazem farinha com ele. Não vai para as reuniões do Eurogrupo como os outros bananas, com as falinhas mansas do costume. Não, este é teso. Atira ao alvo. Exige. Disto ainda não nos tinha por cá aparecido”, reafirma Leonor.
“Não deve é aguentar muito tempo.”
“Estás doida?! – exclama sem desviar os olhos da televisão - e não se aguentaria muito tempo porquê? Este homem é perito em economia e finanças. É autêntico, empenhado e honesto. É um intelectual virado para as práticas, um agente de mudança, mãe. Nunca lá tiveram um destes. É estimá-lo. Pessoas como este homem não se calam, não se ficam. Precisávamos de um igual cá.”
“Não sei se isto ainda lá vai com um Yanis Varoufakis”.
Leonor continua. “ E tu não conheces a língua, portanto não podes perceber, mas ele fala um inglês tão universitário, tão claro… e com esta voz! Os ingleses gostariam de conseguir falar um inglês com tanta classe, acredita.”
"Classe, dizes bem. Aquele cachecol da loja cara não ajudou nada, Leonor! Para estas pessoas nunca há crise!”
“Dar importância às aparências é o teu lema. Este homem vai salvar a Grécia levando-a de volta ao dracma, originando uma alteração séria na ordem da Europa que a médio ou longo prazo se desmembrará. A partir daí recuperaremos a soberania perdida para os gajos do norte… Este homem vai mudar o mundo e tu pensas no cachecol que a mulher lhe ofereceu há dez anos?! Valha-te Deus!”
“Não há bela sem senão, lembra-te”, murmura Esperança.
“Eu acredito nele, mãe. A Grécia servirá como propulsora para a Europa do Sul saltar do euro. Isto é o início do fim. Havemos de voltar a ter uma vida decente. Passaremos por dificuldades, mas essas estão certas com ou sem União Europeia. Queres continuar a pagar o IRS que te têm apresentado pelo direito a auferir uma reforma de 600 euros?! Acorda, mãe!.”
“Não quero, mas o mundo não tem emenda, filha. Nunca teve e nunca terá. É imperfeito desde a origem, de propósito para cumprirmos a nossa pena. Desde muito antes dos meus tempos de criança, quando me sentava no muro da propriedade e julgava que acabava onde terminava o horizonte, desde esse tempo de que nem os que vieram muito antes de nós se lembram.”
“O Varoufakis odeia fatalismo. Por isso é que não se avança”, remata Leonor sem afastar os olhos do ecrã.