Da exposição
O que significa expormo-nos? No meu dicionário particular significa permitir que outros nos conheçam como pretendemos ser conhecidos, o que não implica que venham alguma vez a conhecer-nos como gostaríamos. No meu caso pessoal, há quem interprete a minha exposição de forma totalmente diversa. Para uns sou muito linda e boazinha, para outros, uma bruxa insuportável. Se não me expusesse daria no mesmo. Tive uma colega de quem ninguém sabia coisa alguma. Uns chamavam-lhe a sonsa, outros, a deusa. E a senhora, coitadinha, estava ali sossegada, sem uma palavra, só com bons-dias, boas-tardes.
As pessoas do círculo intelectual e cultural no qual até poderia inserir-me, querendo, mas não quero, odeiam a exposição. Criticam-me em doses moderadas. Como consigo eu escrever sobre as minhas cadelas, sobre a minha mãe, a mulher-a-dias, o meu agente, a minha prima afastada, etc., etc.?
Penso no assunto, a instâncias. Escrevo sobre todas essas pessoas e animais porque são bonitas, ambíguas, narrativas ou poéticas. Escrevo sobre quem é interessante, sobre quem me toca, e porque não vejo mal no que conto. Se outros vêem, são os seus olhos.
A quantidade de exposição é subjectiva; aquilo que para mim é exposição, para outros não o será, e vice-versa. Nunca senti que me expusesse, o que não quer dizer que não o faça, mas os outros é que mo lembram. É evidente que tenho uma vida privada e que a guardo dos olhares alheios, mas os limites do que é uma vida privada é que não são universais. Os da minha são francamente reduzidos. Há uma quantidade enorme de dados pessoais que não sei por que não podem ser públicos; que não quero omitir deliberadamente ou que já não saberia omitir, mesmo que quisesse. O maior risco que corro tem passado pela indistinção entre as minhas personagens e situações autobiográficas e as de ficção. Mas mesmo esse risco, admito, é delicioso de se correr. Admitamos, portanto, que gosto de correr os riscos que escolho. Que tenho apreço pelo fio da navalha, sobre o qual ganhei treino em equilíbrio.
Para além de tudo, a exposição, ao contrário do que se pensa, é uma excelente estratégia de auto-defesa. Querem pegar-me por onde? Está praticamente tudo à vista. E o que não está é porque interessa pouco.