As luas do mundo

 Geninne's Art

O homem que amei não me quis e sonho com ele um par de vezes por semana.
A cabeleireira pousa o telefone no meu peito. Ele é seu amigo. Eu digo, D. Teresa não me corte tanto atrás. Ele ouve-me e pede para falar comigo. Tenho medo. Passaram tantos anos, a minha vida mudou e ainda gosto dele. Ainda gosto tanto dele como se o tempo não tivesse passado, como se fosse a mesmo menina tonta e iludida do tempo das fotonovelas. Falamos ao telefone com carinho. Tudo o que queremos dizer um ao outro está no que não dizemos, nesse silêncio carregado de doçura, falta, aceitação.
Ele pôde controlar a nossa história de amor de acordo com o seu ideário. Pôde decidir se teria lugar, se voltaríamos a cruzar-nos caso Deus não interviesse, e não o fez, mas escapou-lhe um detalhe: eu escrevo, e escrever é um ofício de talhante: cortar o corpo à faca desde a garganta até ao útero, voluntariamente, e o que sai, sai. Puxam-se as vísceras para fora, arrancam-se com a força dos braços, e atira-se a carcaça para os cortadores. Não estava nas suas mãos, nem nas minhas, amar e escrever. Calhou. O destino escolheu o seu alvo. Por isso, está tudo a nu, escancarado aos olhos de quem queira observar, escavar, comprazer-se na vileza, na dor ou na derrota. E eu estou cá, sempre  incomprável, incorruptível, único guardião do nosso amor. E enquanto estiver viva há-de ser assim.

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