Primeiro dia de férias
Estou cansada e doem-me os ossos, por isso resolvi dar uma volta aos dossiers velhos. Parece não haver interrelação entre as duas situações, mas se der ordem ao meu mundo, talvez me sinta menos cansada e as dores desapareçam. Além do mais, preciso de espaço para papelada recente.
Dos dossiers de aulas de 95 até 2005 só se aproveitam as capas de plástico, vulgo micas. Deito fora tudo o que seja ficha, acetato, informação sobre lírica medieval, Fernão Lopes, Bernardim Ribeiro, Antero, Florbela, Torga, Sophia e outras temáticas e autores, bem como gramática. Salvo um recorte antigo de JL, com uma entrevista a Luíz Pacheco, feita em 1997 por Ricardo Araújo Pereira e Rodrigues dos Santos, e aproveito Gil Vicente, Camões, Cesário e Pessoa, encolhendo os ombros e praguejando mentalmente. Trabalhamos para nada. Não há utilidade. Não mudamos nada. Não se vê.
Estou muito cansada. Mudou tudo e eu já não tenho paciência. Acho que no início da carreira os alunos não perguntavam, "porque é que temos de aprender isto?" Eu nunca perguntei tal coisa aos professores. Tinha e pronto. Aprendia. Confiava dever haver uma lógica naquilo. Talvez não houvesse. Era o sistema tal como hoje é o sistema. O que se alterou em mim com os anos foi isso: paciência, energia e crença. Já vi como era vida de adulta e agora gostava de sair, se faz favor. Recebi toda a informação necessária. Sinto que percebi, portanto pôr-me na alheta é que era bom. Não escutar conversas. Não aturar ninguém. Não saber nem querer. Acabar a escravidão. Vão todos morrer longe!
Doem-me as vértebras todas do pescoço. Entretanto, salvo mais micas, enquanto no prédio ao lado picam uma cozinha para remodelação. Sinceramente.